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sábado, 6 de abril de 2019

O Clube Abolicionista de Canguçu

Hoje procurei buscar algo que falasse sobre o tema escravidão negra em Canguçu, já que em nosso município ela foi uma realidade, bem como os quilombos, aldeamentos de escravos fugidos de seus senhores em busca de liberdade.
Segundo o Historiador Agostinho Mário Dalla Vecchia, em seu livro “Memórias da Escravidão”, as matas de Canguçu escondiam quilombos que abrigavam escravos fugitivos de toda a região.
Mas vamos a matéria que recolhi de um antigo jornal local , com certeza encontrado no Museu Municipal, infelizmente não registrei a fonte, mas irei a procura a fim de registra-la, porém, o conhecimento não se perde.
Foto: Cacimba da Prata -Início do século XX - Arquivo fotográfico Museu Municipal Capitão Henrique José Barbosa
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Cangussu, 13 de outubro
A 28 do passado, na casa da câmara, estando presentes muitos cavalheiros devotados a causa do abolicionismo e a banda de música Santa Rosa, procedeu-se a eleição da diretoria do clube emancipador, ficando assim composta:
Presidente: Bernardino Pinto Ribeiro,
Vice-Presidente: Júlio César da Luz,
Tesoureiro: Enéas Gonzaga Moreira,
1º Secretário: Antônio Manoel da Costa,
2º Secretário: Carlos da Costa Bandeira.
Procurador: Gregório Teixeira Lopes do Carmo.
Ás 4 horas da tarde do dia 5, efetuou-se a sessão de posse da diretoria, ante numerosa concorrência de abolicionistas e na presença de muitas famílias.
Depois de estar empossado o presidente do clube e ter agradecido a prova de consideração que lhe dispensavam, confiando-lhe um tão honroso cargo, apresentam-se a comissão de Exmas. Senhoras, que aceitando agradavelmente o convite que lhes fora dirigido, estavam todas dispostas a esforçar-se quanto possível lhes fosse para a pronta e completa extinção da escravidão nesta vila.
A Exma. Sra. Dona Túlia da Luz, que foi oradora da comissão acrescentou que tinham imensa satisfação em concorrer com os seus serviços em prol de tão santa causa, e que seu primeiro passo será garantir donativos para aplica-los à libertação de infelizes cativos. 
Depois de mais algumas palavras, todas recendendo entusiasmo, terminou a oradora sendo saudada por uma longa salva de palmas. Dessa comissão fazem parte, além da Srª Dona Túlia Cézar da Luz, as
Exmas . Srª Dona Pacífica Abreu, Gertrudes Jacundina, Feliciana Amélia Moreira, Theophila Amélia de Mattos e Adelaide Gonçalves do Carmo.
O presidente do clube agradeceu o louvável empenho da ilustre comissão e sobre esse assunto pronunciaram-se encomiasticamente os Srs. Martiniano Lafuente e Gregório do Carmo. A sessão esteve imponente, muito concorrendo para o seu brilhantismo o generoso concurso da sociedade musical Santa Rosa , que tocou bonitas peças de música.
Esta sociedade tem procedido de forma a merecer gerais simpatias por sua prestabilidade e devotamento à propaganda abolicionista, concorrendo sempre com a melhor boa vontade e louvável desinteresse.
Terminada a sessão, foram todos os presentes, precedidos da mesma banda musical assistir a inauguração dos melhoramentos da praça da Matriz. Ali recebidos pela comissão administrativa dos mesmos melhoramentos. 
Sr. Dr. Serafim Luiz de Abreu, Júlio Cezar da Luz e Alexandre Gaspar da Costa, e por entre entusiásticos clamores da população, o Sr. Serafim Abreu pronunciou um eloquente discurso e leu 14 cartas de liberdade concedidas sem ônus algum.
Ás 7 horas concluiu a festa, percorrendo as principais ruas as duas bandas musicais.”
Ainda registrado no mesmo jornal: “Contando 118 anos de idade, faleceu aqui, a preta Libânia, natural da África. Na presente época, poços terão a ventura de chegar a tal idade.”

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Sonho ou carnaval?



"Vida que brota da alma, escondida o ano inteiro...
Vem à tona com tamanha euforia, com tanta intensidade
Que  parece não caber na forma que a encerra,
E ri... e canta... e dança...  e vive tudo de uma vez ,
Para depois dormir mais um ano, sossegada e serena.
Se olhar assim, com olhos comuns, não se identifica esta alma intensa
Que dorme na quarta-feira para voltar no próximo carnaval."


Falar de Carnaval em Canguçu hoje é muito difícil, especialmente para quem é amante desta festa que retrata em sua essência o povo brasileiro, que mostra esta cultura tão particularmente nossa, tão vibrante e miscigenada... É algo que está no sangue, na alma, não se explica e não se entende. Dificilmente um brasileiro é indiferente ao samba, este ritmo tão envolvente e muitos esperam o ano inteiro por esta época do ano  para  cair na folia, sambar, brincar e pular até que chegue a quarta-feira para então, como o palhaço que sai da caixa de surpresa,  voltar com cara de saudade para só sair novamente no próximo carnaval. Isto tudo é mágico e só é percebido por  aqueles que tem dentro de si o sentimento carnavalesco.
Mas  não é fácil falar de Carnaval quando ele se mostra tão diferente na minha Canguçu, diferente sim, pois já tivemos um Carnaval empolgante, envolvente, alegre e quem brincou o Carnaval no Salão do Harmonia até a final da década de 90, sabe do que estou falando. O novo século chegou, cheio de vida, de novidades mas o que se foi levou com ele a magia do Carnaval Canguçuense.
Muitos blocos carnavalescos encheram os salões do  Clube Harmonia e do Clube Recreativo América de alegria. Pessoas como o saudoso “Tio Arlindo Almeida” com seu bloco dos bichos, o seu Manoel e o Paulinho, jamais serão  esquecidas ao relembrarmos os antigos carnavais de rua, quando os mascarados faziam a festa .
Os blocos tradicionais como o Sacarrolha, o Rebu, as Bruxas,  o Cordão do Amor,  O ET , Los Tarados, os Bugres, os Maconeiros, e outros tantos que no momento não lembro, formados por casais ou jovens que brilhavam com suas fantasias que luxuosas, criativas ou apenas expressando ideias em camisetas coloridas viviam este momento tão esperado e a alegria era contagiante desde o “Grito de Carnaval” , passando por  quatro ótimos bailes de salão e acabando na  quarta-feira de cinzas , mas é  claro que o que me deixou mais saudade foi  o nosso “Deixa Falar”, bloco animado que fez a nossa alegria por 10 Carnavais.
O “Deixa Falar” nasceu no carnaval de 1989, sendo seu nome uma homenagem a primeira escola de samba do Rio de Janeiro e teve como tema a “Oficialização da pilcha gaúcha”. Os primeiros componentes foram M. Zuleica G. Reyes, Géder Luiz G.  Barbosa, os irmãos Cacilda, Patrícia e Carlos Manke Bento, João Nei Pereira das Neves, Adriane e Andréia Maximino dos Santos, Gerson Flores Maciel, Marcos Paulo Barbosa de Souza e Angelita Barbosa. O bloco contou com a colaboração especial de Nede Adam Manke ,  do casal Paula e Paulo Perchim e da querida tia Zaida Bento que inclusive nos emprestou o porão da sua casa para sede do bloco, o qual batizamos de “Submundo”. Naquele ano a rainha do carnaval do Harmonia foi Cátia Dittgen Vergara.

Muitos amigos foram chegando e outros acabaram deixando este bloco carnavalesco tão especial. Integraram-se ao “Deixa Falar”: Airton Flores Maciel, Flávia e Carla Rosane Casarin Flores, Orivelson de Souza Moreira, Eliane Bichinho Oliveira, Marcos Manke, Noé Izomar de Moura da Silva, Maria Cândida Reyes Gularte e Mario Alberto Morales Gularte, Adriano Martin Funk, Sérgio Hianduí Nunes de Vargas, Carla Borges Guerra, Zelton Pereira das Neves, Marcelo Guerra da Cunha, Flávio Manke Júnior, Jane Maria Guerra da Cunha e Saul Moreira da Cunha, Cláudia Silva da Fonseca, Luciana Maciel Viana, Alexandre da Silva Soares e Simone Bório Soares, Marivan Souza da Silva Vergara e Fábio Prestes Vergara, Cláudio Roberto Rosa Quevedo, Ângela Maria Silveira Jacondino e Carlos Benhur Nunes Jacondino, Arlete Riskow Camargo e Cíntia Ferreira Specht.

Foram presidentes do Bloco carnavalesco Deixa Falar: Carlos Manke Bento,  Géder Luís Goulart Barbosa, Patrícia Manke Bento, Miriam Zuleica Goulart Reyes, Jane Guerra da Cunha, Simone Bório Soares, Fábio Prestes Vergara e Adriane Maximino dos Santos.

Maravilhoso lembrar tudo isso... rever fotografias, relembrar as músicas que eram compostas baseadas nos temas apresentados pelo bloco. Além de todas essas lembranças ainda guardamos as camisetas, algumas fantasias,  faixas, o estandarte e  os troféus que o bloco conquistou ao longo dos 10 anos de existência.

Parabéns ao nosso “Deixa Falar” e a todos os  Blocos  Carnavalescos que animaram o Carnaval de Canguçu em todas as épocas.


Fotos: Carnaval de 1989 e Carnaval de 1995 - Arquivo fotográfico particular

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Personagens inesquecíveis

Em razão das férias passei um tempo afastada mas agora estou  de volta, penso no que escrever e me ocorre que espaços como este, que  se destinam a registrar a história local  devem trazer  histórias de homens comuns, ou seja,  daqueles que pelo modelo tradicional de escrever, estariam a margem do registro, ficando o espaço reservado para os que realizaram grandes feitos ou ocuparam lugar de destaque em determinado momento.

Pois bem, esta semana fui surpreendida com a notícia nas redes sociais de que um dos personagens folclóricos guardados com carinho na minha memória, João Medeiros, o conhecido João Popó,  completou seus 109 anos e estava sendo homenageado com carinho por sua família. João Popó juntamente com o Rosca, a Cidália, a Nair, a Dalva Garrão, o Major, a Santinha e tantos outros, foram mais que pessoas comuns, foram personagens que enfeitaram o dia a dia desta cidade e povoaram o imaginário das crianças que viveram sua infância na década de 70.


Todas as pequenas cidades, em todos os tempos, veem passar por suas calçadas estas pessoas que deixam sua marca de maneira diferente do padrão, mas estas pessoas com suas existências tão especiais ficarão  guardadas para sempre na  memória, seja por seu carisma, pelas histórias fantásticas que os rodeiam como virar lobisomem, seja por uma  longa barba branca e  terno cinza surrado, seja como um romântico par, ou mais recentemente como quem  cantava a “Madalena”, ou outro que, inocente como criança, se alegra em assustar seus conhecidos, ou mesmo aquela que, rodeada por seus cachorros, é uma figura tão especial em nossa Canguçu. Não preciso dizer seus nomes, todos nós conhecemos estes que foram citados e outros tantos que passaram por estas calçadas e deixaram suas marcas.


Levantando o véu da história de nosso município, ressurge neste momento um personagem que não cheguei a conhecer, o Patuá, não este Patuá que hoje conhecemos mas um antigo morador desta terra  que muitos canguçuenses com certeza ainda lembram.



Imagem:  Arquivo Fotográfico do Museu Municipal Capitão Henrique José Barbosa


PATUÁ


Não assistiu ninguém ao formidável fim

Daquele homem pobre de corpo tão torto

Quando o acharam calmo e só, estava morto

Morrera só, coerente de viver assim.


Alma boa, a desgraça o não fizera ruim

Lembrava um quasímodo: dava um desconforto

Vê-lo sentado e triste como um Buda absorto

Uma caricatura horrenda para mim!


Alma chumbada a vida,

O corpo ao chão chumbado

Quando bebia muito, esvoaçava os braços

Como se fosse, o pobre, um Ícaro tombado!

Bebera a vida inteira, era esse o seu cunho

E pressentindo a morte escutando seus passos,

Quis morrer calmo e só,

Morrer como um “tutumunho”.


Quem não conheceu o Patuá? Por certo que todos os habitantes de Canguçu e mesmo os forasteiros que estacionaram, ainda que por poucas horas no hotel Brasil, de cuja caridade viveu longos anos, tiveram ensejo de conhecer aquela figura popular a quem a natureza criminosa tudo negara. Achaparrado e disforme, horrente aspecto a locomover-se de mãos ao chão era, entretanto uma alma boa. Em sua memória apresentamos um soneto da verve do Dr. Jorge de Moares,  onde o ilustre vate conseguiu de forma muito feliz apresentar-nos uma imagem nítida do pobre Patuá.


Fonte: Jornal a Voz de Canguçu  ano de 1953 - Museu Municipal Capitão Henrique José Barbosa.